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A força do bolsonarismo nas redes

Repercussão de entrevista mostra eficiência e engajamento

26 de agosto de 2022

Helena Martins e Eduardo Barbarela, Observatório das Eleições, 24 de agosto de 2022

Ataques às urnas, defesa de tratamento precoce contra o coronavírus, desmatamento como resultado de causas naturais. Essas e outras alegações já fartamente repetidas – e desmentidas – vieram novamente à tona na entrevista concedida por Jair Bolsonaro (PL) ao Jornal Nacional, a primeira da série de entrevistas com os presidenciáveis. Ainda que num tom mais comedido, o candidato à reeleição manteve a estratégia de falar para seu público, sem mudar o discurso que vem desenvolvendo ao longo do mandato. Ao contrário, as teorias conspiratórias foram acompanhadas de frases rápidas replicáveis nas redes sobre “liberdade de expressão” e fazer “cumprir a lei”. Nem mesmo a suspeição sobre as eleições foi deixada de lado, apesar da insistência do âncora William Bonner em arrancar compromisso com o resultado das eleições. No máximo, Bolsonaro afirmou que “serão respeitados os resultados das urnas, desde que tenhamos eleições limpas e transparentes”.

Nas redes, a conversação sobre a entrevista foi expressiva, o que mostra a importância da TV e do Jornal Nacional, que registrou 32 pontos em média durante a participação de Bolsonaro. Logo no início, em uma tentativa de direcionar críticas que tem recebido ao interlocutor, Bolsonaro disparou contra William Bonner: “Fake news da sua parte”, afirmou, ao ser questionado sobre xingamentos contra ministros do Supremo Tribunal Federal. A resposta gerou réplica de Bonner, que insistiu na validade de sua afirmação. Nas redes, o confronto entre o presidenciável e o jornalista já estava anunciado. Antes de a entrevista começar, o Twitter registrava 34 mil postagens com a hashtag #BolsonaroNoJN e 23 mil sobre Bonner, 2o e 6o lugares no ranking dos principais assuntos às 20h23. Depois do embate, Bonner era o tema de 72,8 mil tweets. #BolsonaroNoJN, de 47,3 mil, 1o e 3o no ranking, respectivamente. Uma hora e meia após o início da entrevista, havia 446 mil tweets sobre Bonner, o assunto mais comentado de então. Em segundo, #GloboLixo, com 187 mil menções. #JornalNacional já ocupava a 3a posição, seguida de temas tratados na entrevista, como Amazônia e centrão. As hashtags e os principais posts mostram uma disputa nessa rede, com predomínio de conteúdos críticos ao atual presidente.

Dados do monitoramento do Observatório das Eleições apontam que há um desequilíbrio enorme entre os pólos políticos no Facebook. Acompanhando 44 perfis de destaque das redes bolsonarista e lulista nas 12 horas que se seguiram à entrevista, percebemos que o conjunto dos principais agentes do campo do atual presidente publicou 64 postagens, gerando 2.423.686 interações. A rede de Lula, por sua vez, publicou 57 posts e gerou 159.851 interações nessas publicações. O bolsonarismo aparece com uma média de interações 13,5 vezes maior do que a lulista.

Tabela 1. Engajamento no Facebook do lulismo e do bolsonarismo 12 horas após a entrevista Nº de postagensTotal de InteraçõesMédia de Interações por postBolsonarismo642.423.68637.870,09Lulismo57159.8512.804,40 

Os conteúdos com maior repercussão foram postados pela conta oficial de Bolsonaro, sem concorrente à altura. Em primeiro lugar, Bolsonaro reproduz um vídeo de seu encontro com apoiadores no Projac, em Curicica, no Rio de Janeiro. O vídeo, transmitido ao vivo após a entrevista, apresenta uma pequena fanfarra que esperava o presidente nos estúdios da Globo. Ao final, já dentro de um carro, Bolsonaro convida seus apoiadores a participarem dos eventos do dia 7 de setembro no Rio de Janeiro. A postagem obteve mais de 1,18 milhão de visualizações nas 12 horas que se seguiram à participação na Globo.

A segunda publicação com maior taxa de interações é também de Bolsonaro. Trata-se de um texto em que critica a Globo de forma irônica: “Foi uma enorme satisfação participar do pronunciamento de William Bonner Kkkkk. Na medida do possível, com muita humildade, pudemos esclarecer e levar algumas informações que raramente são noticiadas em sua emissora”. Às 8h50 do dia seguinte ao debate, o conteúdo registrava 214 mil reações, 28 mil comentários e 9,9 mil compartilhamentos. Também obteve muito engajamento o vídeo com trecho da entrevista em que o candidato afirma ter enfrentado dificuldades como guerra, pandemia e seca, mas ressalta que “nós fizemos todo o possível para que a população sofresse o menos possível”. O post, que busca dar respostas aos impactos da crise econômica que afeta os brasileiros, somava, na manhã da terça-feira, 125 mil reações, 14 mil comentários e 19 mil compartilhamentos. A postagem de Bolsonaro assistindo ao SBT nos bastidores da Globo, antes da entrevista, recebeu 7,3 mil comentários e 3,6 mil compartilhamentos.

Tabela 2. Publicações do lulismo e do bolsonarismo 12 horas após a entrevista no InstagramNº de postagensTotal de InteraçõesMédia de Interações por postBolsonarismo142.329.363166.383Lulismo273.175.032117.594 

No Instagram, a disputa foi menos desigual e com menos postagens, apenas 41. Do total de posts, 27 foram do núcleo lulista (66%), enquanto 14 foram do núcleo bolsonarista (34%). O núcleo do ex-presidente Lula conseguiu maior quantidade bruta de interações: 3.175.032, contra 2.329.363 da rede bolsonarista. No entanto, quando comparamos as médias, o resultado é pró-Bolsonaro: a rede do atual presidente teve uma média de 166.383 interações por post, enquanto a rede Lulista teve uma média de 117.594 interações por publicação.

Bolsonaro e seus apoiadores também dominaram o topo das publicações com maior número de interações no Instagram. Em primeiro lugar, está uma reprodução de um tweet do presidente agradecendo a audiência de sua entrevista no Jornal Nacional e ironizando a atuação de William Bonner. Publicações de Bolsonaro também aparecem na segunda e terceira posições. 

Em suma, podemos concluir que tanto no Facebook como no Instagram, o bolsonarismo atuou de forma mais eficiente do que o lulismo. Mesmo que não seja possível avaliar se as publicações furaram as respectivas bolhas ou se as interações foram impactadas pela presença ou não de robôs, os dados demonstram que o bolsonarismo aproveitou melhor o evento para fortalecer sua narrativa dentro das redes sociais, principalmente no Facebook. No Instagram, a situação se demonstrou mais equilibrada, apesar de a rede de Bolsonaro se apresentar mais eficaz na média – a rede de Lula alcançou maior número de interações e publicou um maior número de posts. A estratégia de overposting pode ser uma alternativa para conseguir superar os altos números de seguidores que as páginas bolsonaristas têm, hipótese que se mostrará válida ou não nos próximos passos da campanha. 

Helena Martins é professora de Comunicação Social – Publicidade e Propaganda da UFC e do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da UFC. Pesquisadora do Telas e do Obscom-Cepos e Eduardo Barbabela é doutor em Ciência Política pelo IESP-UERJ. Pesquisador do IESP-UERJ e subcoordenador do Projeto Manchetômetro.