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Assassinato por sanções

1 de maio de 2020

Solidarity, International Viewpoint, 14 de abril de 2020

Declaração do Comitê Nacional do Solidarity, seção estadonidense da IV Internacional, corrente do Democratic Socialists of America

Enquanto o número global de mortos do coronavírus chega às centenas de milhares - e enquanto Donald Trump continua diariamente com a sua má liderança, manipulação política e pirataria de suprimentos médicos críticos, falsas alegações de curas milagrosas (nas quais ele tem interesses financeiros pessoais), sabotagem dos seus próprios especialistas em saúde pública, absurdos sobre a "reabertura da economia" até 1º de maio, e demissão de funcionários em retaliação à exposição de sua extorsão criminosa da Ucrânia - outras crises não desapareceram. Muito pelo contrário.

Entre as muitas questões sub-publicizadas estão as sanções punitivas dos EUA contra os governos "inimigos", incluindo em particular o Irã, Venezuela e Cuba. Estas sanções já eram assassinas antes do surto do coronavírus, particularmente no que diz respeito à saúde pública. Nas condições atuais, tais medidas são quase genocidas.

Parece que Cuba, que está sob bloqueio imperialista dos EUA há quase seis décadas, está evitando o pior impacto. Cuba tem enviado médicos para ajudar alguns países mais atingidos. (A quase total proibição americana do turismo na ilha pode ter sido um golpe de sorte para a medicina, embora ruinosa para a economia). Mas, junto com o colapso dos preços do petróleo, as proibições americanas de transações financeiras são particularmente catastróficas para o Irã e a Venezuela.

No caso iraniano, as promessas europeias de construir uma ponte para as transações comerciais, a fim de salvar o acordo nuclear multilateral, caíram por terra. Tem sido um fracasso quase total, embora amplamente previsível, das classes dirigentes e dos governos europeus em se oporem aos ditames de Washington. Os suprimentos médicos desesperadamente necessários estão simplesmente indisponíveis, especialmente no Irã rural.

Pode-se argumentar que o regime iraniano foi irresponsável, complacente e arrogante na sua desconsideração precoce do desastre do coronavírus - particularmente na recusa das autoridades religiosas em fechar os santuários em Qom e nas aglomerações em massa lá, o que parece ter sido um epicentro da propagação da pandemia para o Paquistão, Afeganistão e Oriente Médio.

Mas isto diz apenas que os governantes do Irã são (quase) tão ignorantes e falidos quanto o próprio Donald Trump - um modelo difícil de igualar - e que alguns de seus "líderes" religiosos são tão criminosos quanto aqueles pastores americanos piedosos que mantêm suas mega-igrejas abertas, e governadores que declaram as igrejas "serviços essenciais" enquanto forçam o fechamento de clínicas de aborto.

No caso da Venezuela, o crime imperialista vai além até mesmo das sanções econômicas. Após o fracasso do golpe militar do ano passado contra o governo Nicolas Maduro, o Departamento de Justiça dos EUA - um título que George Orwell não poderia sonhar - escolheu este momento para acusar o próprio Maduro de tráfico de drogas.

Não importa, por exemplo, as ligações com o tráfico do presidente hondurenho e aliado norte-americano Juan Orlando Hernandez. O único objetivo da acusação de Maduro pode ser incitar uma segunda tentativa de golpe militar, com o incentivo de uma grande recompensa por sua extradição - o que provocaria uma guerra civil total em um país já em condições de colapso médico e social.

Imagine uma crise de refugiados em tal cenário. Não é exatamente isso que a Venezuela e a América Latina precisam neste momento de uma pandemia mundial em expansão, para a qual muitos de seus serviços de saúde estão desesperadamente mal preparados.

Enquanto o ataque americano ao Irã tem uma "lógica" geopolítica material em termos de controle do fornecimento de petróleo e de sustentar a aliança de Washington com a Arábia Saudita e outros interesses estratégicos do Estado, a campanha anti-Venezuela parece ser impulsionada principalmente por uma ideologia de direita. Não é um conflito que a maioria do capital norte-americano quer ou precisa.

Nada sobre a Venezuela (infelizmente) é uma "ameaça" ao poder americano em sua atual condição arruinada. A história nos ensina que guerras ou ameaças de guerra movidas primariamente por ideologia são ainda mais perigosas do que aquelas baseadas somente nos interesses de Estado, que já são ruins o suficiente.

É importante aqui chamar a atenção para a cumplicidade bipartidária dos EUA no bloqueio de Israel a Gaza, que - muito antes do coronavírus - destruiu a infra-estrutura médica que serve à população desesperadamente amontoada em Gaza. Enquanto impõe sanções brutais a outros países, Trump e grande parte do Congresso estão tentando criminalizar a campanha BDS (boicote/desinvestimento/sanções) de apoio aos direitos da Palestina.

Nas atuais circunstâncias globais aterrorizantes, a deliberada destruição por sanções de economias e da infraestrutura de saúde de nações inteiras não é apenas um ataque contra os povos desses países. Terá um terrível efeito em toda a luta internacional contra uma pandemia mortal. A frase "crimes contra a humanidade" nunca foi tão apropriada.

Comitê Nacional do Solidarity, 14 de abril de 2020