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Falsa Inclusão: um debate sobre prévias on line no PSOL de SP

O modelo de decisão, no contexto da pandemia, precisa colocar a realidade da classe trabalhadora em primeiro lugar

30 de junho de 2020

Simone Nascimento e Jussara Basso*, São Paulo, 30 de junho de 2020

A pandemia do coronavírus abriu uma encruzilhada: vida ou lucro? Solidariedade ou individualismo? Nosso futuro está em jogo e precisamos ser ponta de lança dessa disputa.

Enfrentamos um momento de graves retrocessos no Brasil. O governo Bolsonaro representa um projeto de destruição nacional e ataques aos direitos do povo. No município de São Paulo, a realidade não é muito diferente. A gestão Dória-Covas aprofunda o projeto neoliberal e transforma a cidade em mercadoria, optando pelas privatizações e redução de investimentos. Não à toa, desde 2015 cresceu 60% o número de pessoas sem teto para viver.

Por isso, temos respondido esses ataques com muita organização coletiva, mesmo em tempos desfavoráveis para os mais pobres, tentando trilhar um caminho para construção de uma Revolução Solidária, que nutra os valores do nosso cotidiano de resistência nas periferias brasileiras para construção de uma nova sociedade.

Nós duas, mulheres pretas de periferia, temos muito orgulho de construir o “Fundo de Solidariedade aos Sem Teto” e a “Quarentena Popular”, campanhas de solidariedade que têm aliviado um pouco a dor do nosso povo diante do desemprego, do atraso do auxílio emergencial e da ausência de um auxílio estadual ou municipal, já que os governos Jair Bolsonaro, João Doria e Bruno Covas não fazem o mínimo de suas obrigações!

Além de militantes do MTST, do MNU e do RUA - Juventude Anticapitalista, nós somos militantes do PSOL, um partido que reúne a capacidade de aglutinar a esquerda anticapitalista brasileira e que viverá, em 2020, uma disputa eleitoral desafiadora.

Através da nossa luta coletiva, somos parte ativa da construção desse partido, onde queremos ver, cada vez mais de nós, negras e negros e da periferia. E é nesse contexto, de forte crise econômica e sanitária, gerada pela necropolítica dos governantes, que nosso partido vive hoje a discussão de como construir suas representações para essa disputa.

E está em debate, nesse momento, qual modelo iremos utilizar para decidirmos as pré-candidaturas às prefeituras das cidades nas eleições 2020. A partir da decisão de seus diretórios, instâncias eleitas pela base do partido em seu congresso, o PSOL está debatendo um modelo de prévias eleitorais, para escolha onde há mais de um pré-candidato. Na cidade de São Paulo, temos a participação dos companheiros Guilherme Boulos - que traz como indicação de vice a companheira Luiza Erundina -, Sâmia Bomfim, e Carlos Giannazi.

Em meio à pandemia, o partido está impossibilitado de adotar seu método de debates presenciais em plenárias de base de filiados, eleições de delegadas e delegados e conferências para a definição de resoluções, táticas e escolhas de candidaturas. Sendo assim, acreditamos que o modelo de decisão, no atual contexto, precisa colocar a realidade da classe trabalhadora em primeiro lugar.

Diante disso, alertamos para as falsas possibilidades de inclusão. A proposta de votações online, em nossa opinião, é incoerente com o que defendemos no front da luta. O PSOL foi ponta de lança, por exemplo, ao denunciar que a manutenção do ENEM, diante da pandemia, prejudicaria os nossos jovens pobres, sem acesso à internet, equipamentos, ou pacote de dados, para estudar à distância. Fomos vitoriosos, adiamos o ENEM através de uma forte luta popular, mas após isso, nossas crianças e jovens seguem sem acesso ao Ensino Escolar remoto. Nossos professores seguem em precárias condições de trabalho à distância e o home office não é a realidade da maioria do povo.

Através das campanhas de solidariedade, vivenciamos o sufoco de cadastrar nosso povo no auxílio emergencial, quando muitos não possuem celular ou internet. E afirmamos: essas pessoas também estão dentro do PSOL e não podem ser excluídas das decisões partidárias, pois queremos cada vez mais de nós construindo nosso partido.

Portanto, não é verdade que a votação virtual é democrática, porque ela não dá condições iguais de participação nas nossas circunstâncias concretas. Este mecanismo sequer é mais democrático do que os diretórios do PSOL, que são a expressão legítima da base partidária, pois foram eleitos em nosso congresso, instância máxima de decisão, com debate, teses e eleição de delegadxs em plenárias presenciais. Nesse momento de crise pandêmica, são as instâncias mais plurais e legítimas da diversidade interna do Partido Socialismo e Liberdade.
 

Mesmo assim, consideramos que mesmo em tempos de pandemia e incertezas e divisão no partido, devemos tentar buscar um método de consulta mais amplo que contribua com a unidade do partido onde há disputa de nomes.

Se iremos adotar o modelo de prévias, que sejam dentro das regras sanitárias, com possibilidade da militância do centro e da periferia participarem. Não é democrática a votação virtual. Portanto, o PSOL deve realizar prévias por meio de votação individual em urna, uma vez que esse é o procedimento com maior nível de confiança e possível de ser realizado num contexto de pandemia. A proposta de um método misto, combinando o virtual e presencial, simplesmente não oferece as condições de segurança digital necessárias. Temos pouco mais de 15 dias para a realização das prévias. É impraticável que nesse prazo tenhamos um método seguro e com resultados confiáveis, até porque o partido jamais o utilizou. O PSOL deve sim assegurar formas de participação do grupo de risco, mas de modo confiável e sem exclusão.

Nessas eleições, queremos que o PSOL represente, mais uma vez, a esperança de milhares de pessoas que acreditam num projeto popular, com diversidade e ligado às periferias, aos sem-teto, à luta dos negros e negras, da juventude, mulheres, LGBTs e à ecologia. Queremos construir um projeto de Direito à Cidade, com respeito ao meio ambiente. Queremos um projeto com ousadia para enfrentar as máfias, a especulação imobiliária e propor o novo, mas que saiba da importância da unidade para enfrentar o bolsonarismo num momento de tantos retrocessos e acreditamos, que independente de quem for nos representar nessa disputa, os métodos de escolha devem rejeitar a exclusão e desigualdade social.

Devemos seguir com essa forte luta que nossas bancadas e militância, a nível nacional, estadual e municipal têm protagonizado. Queremos nossa militância cada vez mais ativa nas decisões do partido, que mais do que a votar, como faz o regime burguês eleitoral, realize debates regulares, construa e fortaleça as campanhas e lutas contra o governo.

Apoiamos o manifesto “Quero Boulos & Erundina para mudar São Paulo”, mas acreditamos que os pontos colocados por nós neste texto são para reflexão de toda a militância do PSOL e seguiremos lado a lado, por uma Revolução Solidária!

*Simone Nascimento: moradora de Pirituba, filiada ao PSOL desde 2014, faz parte do Movimento Negro Unificado SP e é fundadora do RUA - Juventude Anticapitalista.

*Jussara Basso: Moradora do Jardim Maria Sampaio, filiada no PSOL. Militante do MTST desde 2012 e coordenadora da Ocupação Vila Nova Palestina.