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FRENTE À CONFERÊNCIA ELEITORAL DO PSOL, A POSIÇÃO DA INSURGÊNCIA

Derrotar Bolsonaro e sua ofensiva reacionária é tarefa prioritária do movimento de massas e das organizações revolucionárias no país, mas o compromisso do PSOL com a vitória de Lula não deve autorizar a dirigentes, miitantes de movimento ligados ao partido participar, comporos governos federal e estaduais do PT.

25 de abril de 2022

Editorial da Coordenação Nacional da Insurgência, tendencia interna do PSOL. Abril de 2022.

A vitória de um presidente neofascista nas eleições de 2018, na conjuntura reacionária aberta com o golpe de 2016, permitiu uma aceleração do avanço da barbárie sobre a vida de milhões de brasileiras e brasileiros: quase 700 mil mortos pela Covid (sem falar das subnotificações), devido ao negacionismo e à negligência do governo no trato da crise sanitária – ao que se soma deterioração geral das condições de vida devido ao alto desemprego, destruição de direitos trabalhistas, renda em queda e inflação em alta, elementos de recolocaram o país no mapa mundial da fome. 

De fato, coma conspiração vitoriosa para derrubar Dilma, a maior e mais poderosa parte da burguesia brasileira já havia optado por impor um salto de qualidade ao projeto ultra-neoliberal de incremento da exploração (leia-se recuperação e aumento das taxas de lucro) a qualquer custo. A vitória de Bolsonaro veio facilitar enormemente esse caminho. A manutenção do globalmente inédito teto de gastos públicos, imposto pelo golpista Michel Temer, se associa, sob a batuta doespeculador Guedes, à destruição das políticas públicas acumuladas desde a Constituição de 1988, com tática de “terra arrasada” sobre a legislação ambiental, os direitos humanos, a saúde, a educação e a assistência social, além da luz verde federal para ampliar os genocídios dos povos negro e indígenas, para a violência racista e machista institucional, para o armamento sem controle e a multiplicação de grupos de extermínio.  

O país se tornou o terceiro pior lugar do mundo para trabalhar. As reformas trabalhista previdenciária legalizaram a extinção do conceito de seguridade social e a precariedade generalizada. Infelizmente, as importantes mobilizações pelo ‘Fora Bolsonaro’ de 2021 não asseguraram sua derrota nas ruas. Por isso, os trabalhadores e povo brasileiros, que necessitam mais do que nunca  outra e radical política econômica, uma política sócio-ambiental de verdade e a adoção de políticas sociais contundentes, vêem na luta por eleger Lula o caminho paratirar do poder o neofascismo.  

No entanto, essas necessidades não podem ser satisfeitas sob as regras do teto de gastos públicos e demais limites colocados pelos mercados financeiros internacionais. Para recuperar autonomia, por fim à fome e à miséria, é preciso quebrar essa subordinação às finanças. Para começar a trilhar outro caminho, o Brasil tem a tarefa primeira de livrar-se da ultra-direita no poder, que,  ademais da destruição sócio-econômica, representa uma permanente ameaça ao próprio regime democrático-burguês.  

Polarização e violência 

Depois de três anos e meio de resistências e de grandes manifestações, em 2021, pelo Fora Bolsonaro, as eleições deste ano se revestem de importância maior que a habitual: tornaram-se a grande oportunidade para que se derrote o presidente e se assente um golpe fundamental no bolsonarismo. Bolsonaro e o bolsonarismo, no entanto, não pretendem perder fácil as eleições de outubro.  

Apoiado num dos Congressos mais conservadores e fisiológicos já eleitos, o presidente não teve pruridos em trair seu próprio discurso para comprar o venal Centrão, manter o apoio de pastores antirrepublicanos de vastos rebanhos, distribuir entre aliados milhões de dinheiro público, com o objetivo de garantir apoio em estados e municípios. Em ano eleitoral e em desvantagem provisória nas pesquisas, o presidente neofascista lança mão de medidas populistas clássicas, como o Auxílio Brasil (um Bolsa Família emagrecido), além do discurso contra a política de preços da Petrobras – contra a qual esbraveja e não faz nada – e das milícias digitais de ódio dirigida pela famiglia. Continua e deve intensificar os ataques ao STF, com o intuito de garantir meios ilegítimos para espalhar fake news e discurso de ódio, ao mesmo tempo em quedisputa politicamente o comando das Forças Armadas – como demonstram os episódios do indulto ao deputado fluminense neofascista e o contra-ataque do Ministério da Defesa às denúncias do ministro Barroso. 

A campanha eleitoral tende a ser marcada pela polarização extrema da candidatura ultradireitistado atual mandatário com a candidatura de Lula, dado o fracasso dos esforços burgueses por construir uma terceira via com chances reais. O ex-presidente petista é visto por amplos e por ora majoritários setores dos trabalhadores e do povo como o instrumento para derrotar Bolsonaro e, com ele, a insegurança, o desemprego, o racismo, a inflação, a miséria e muitas vezes – como no caso de indígenas e comunidade LGBTQI, a morte.  

O neofascista, por seu lado, parte da vantagem de contar com cerca de 10% do eleitorado (quase 16 milhões de pessoas) de uma fidelidade canina a seu ideário antidemocrático. O projeto autoritário é respaldado por 30% do eleitorado, contando com apoio de parcelas importantes do capital financeiro, mineradores e agronegociantes, que não desembarcaram do governo. 

Nesse cenário, as chances de episódios de violência são altas e exigem das forças populares e da esquerda políticas para a autodefesa das comunidades, organizações populares e partidos antibolsonaristas. Como expressão brasileira de um fenômeno internacional de reforço das extremas direitas. Bolsonaro candidato, assim como o foi como presidente, seguirá em queda de braço com o sistema eleitoral e as instituições fundamentais.  

Diante de um cenário em que a candidatura Lula é a única que permite derrotar Bolsonaro –possibilitando liberar forças para seguir a luta contra o bolsonarismo –, a Insurgência delibera lutar pela inserção respeitosa do PSOL na campanha de Lula à Presidência da República, visando que o partido não tenha apenas o papel de distribuir panfletos, mas seja capaz de estabelecer o diálogo e procurar influir sobre a vanguarda que nela estará. O PSOL representará, nessa grande frente eleitoral de partidos e movimentos para derrotar Bolsonaro, as lutas dos explorados e oprimidos, e dos movimentos sociais nos e nas quais a militância partidária atuou nos últimos anos.  

Desse modo, devemos organizar e participar ativamente dos comitês da campanha, dos atos e estampar a necessidade de derrotar o presidente neofascista - com o voto em Lula - em nossos materiais de campanha das candidaturas proporcionais. Não existe espaço para um apoio apenas formal, é preciso cumprirmos um papel ativo na campanha, ampliando a unidade de ação conquistada na luta contra o golpe de 2016, no vira-voto do segundo turno das eleições presidenciais de 2018 e nas jornadas nacionais pelo Fora Bolsonaro, para garantir a posse de Lula, defendendo-a contra ações autoritárias e reacionárias que não reconhecerão o resultado das urnas. 

Por isso, devemos participar ativamente e ajudar a construir comitês da campanha, atos e comícios eleitorais e, em nossos materiais de campanha das candidaturas proporcionais, chamar o voto em Lula, apesar da coligação com o tucano de direita Geraldo Alckmin. Além do apoio eleitoral militante, será necessário estarmos alertas para as quase certas tentativas futuras de impedir a posse do candidato da oposição pela via do não reconhecimento da derrota e da mobilização de seus apoiadores.

Essa militância pela vitória de Lula contra o neofacista e nosso compromisso na luta por garantir sua posse, no entanto, não significa para nós que o PSOL deva participar do governo Lula-Alckmin ou de qualquer governo estadual e municipal das coalizões do PT. Mantemos o balanço crítico de que seus governos federais e estaduais ficaram muito aquém das medidas econômico-sociais, ambientais e políticas necessárias para tirar o Brasil da crise e operar a historicamente inadiável distribuição mais justa da riqueza nacional.  

Se se manteve, durante quase quatro mandatos, sob os limites rígidos do social-liberalismo, é possível antever os tremendos entraves para avanços sociais significativos que terá a atual coalizão do PT com o tucanato paulista e parte do Centrão – os mesmos que ajudaram a urdir e executar o impeachment de Dilma Roussef.

Dessa forma, defendemos desde já a completa autonomia e independência do PSOL frente aogoverno Lula e outras administrações petistas estaduais e municipais, aos quais não devemos hesitar em fazer oposição em caso de medidas antipopulares, ataques a direitos e organização dos trabalhadores e do povo. Com esta visão, buscaremos incidir na disputa para que o partido de conjunto tenha essapostura. 

O PSOL sobreviverá se mantiver seu lugar de independência sem abrir mão da política antifascista. Poderemos nos ver obrigados a fazer oposição, mas não nos absteremos da unidade de ação contra os fascistas, com o PT e todas as demais forças dispostas a impedir o avanço do bolsonarismo, se necessário. Não estar no governo, portanto, não significa ignorar que o bolsonarismo seguirá uma força política influente na sociedade e institucionalidade brasileiras. 

O partido deve ser tão implacável na defesa das liberdades e direitos democráticos quanto no combate, sob qualquer governo, à dinâmica infernal do sistema capitalista neoliberal, com seu ideário de consumismo, individualismo, devastação da natureza, mercantilização e precarização da vida, bem como na contribuiçãocotidiana às mobilizações auto-organizadas da classe em suas multiplicidade e em resposta a todos os ataques. Os exemplos da derrubada da constituição pinochetista no Chile e das mobilizações feministas, antirracistas e populares na Argentina e na Colômbia são nossas referências para enfrentar o cenário político difícil. Assim, cumprimos a vocação original do PSOL de construir um caminho estratégico de luta por um modelo de sociedade que rompa com as concessões às oligarquias e representações das classes dominantes.