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Insurgência: Um governo Bolsonaro mais frágil e radicalizado

8 de abril de 2021

Executiva Nacional da Insurgência

1. As mudanças ministeriais promovidas por Jair Bolsonaro em 29 de março de 2021 evidenciaram um importante desconforto de lideranças das Forças Armadas com o governo. A demissão do General Fernando Azevedo como Ministro da Defesa e sua substituição pelo general Braga Netto fez com que os comandantes das três armas - Edson Leal Pujol (Exército), Ilques Barbosa (Marinha) e Antônio Carlos Bermudez (Aeronáutica) - apresentassem sua renúncia. José Levi foi também substituído pelo até então Ministro da Justiça André Mendonça na Advocacia Geral da União e o delegado de Polícia Federal Anderson Torres - agregado da família Bolsonaro - tornou-se Ministro da Justiça e Segurança Pública. Estas trocas evidenciam que o presidente e sua família buscam se cercar de aliados incondicionais na área militar e jurídica.

2. Estas alterações não eliminam o apoio dos militares ao governo Bolsonaro, mas evidenciam seus limites em um momento em que o presidente tem que conceder um espaço cada vez maior no governo ao Centrão. Flávia Arruda foi indicada Ministra-Chefe da Secretaria da Governo, responsável pela articulação com o Congresso. Ernesto Araújo foi substituído no Ministério das Relações Exteriores pelo O embaixador Carlos Alberto Franco França, atendendo a pressões do empresariado descontente com seu “olavismo”. Jair Bolsonaro discute ainda com aliados do Centrão a substituição de mais três ministros: Ricardo Salles (Meio Ambiente), Bento Albuquerque (Minas e Energia) e Gilson Machado Neto (Turismo).

3. O país está à deriva, sob uma crise sanitária catastrófica, sem precedentes. Inicia o mês de abril com 320 mil mortos, 63 mil em março. Também não existe hipótese possível da economia brasileira recuperar-se, este ano ou no próximo, do tombo de 4,5% ocorrido em 2020. A situação da economia se espalha por todo o tecido social: o maior número de desempregados da história do país, a redução radical do auxílio emergencial, o recrudescimento da fome e a volta da inflação dos combustíveis e alimentos.

4. É difícil imaginar um governo que se fortaleça em tal cenário. Bolsonaro vê seu apoio reduzir-se a sua base social mais fiel, enfraquece seus vínculos com as classes dominantes e amplia seu isolamento internacional. A sua vitória nas eleições das casas legislativas em janeiro, fruto de sua adesão ao Centrão, vem cobrando seu preço e se multiplicam sinais de fragilidade política.

Entre eles podemos listar:

a) a queda crescente de popularidade, incluindo a derrota acachapante na disputa da vacina na população (85% da população são a favor da vacina);

b) a carta dos grandes empresários e operadores do mercado do país com ultimatos explícitos;

c) a derrota no STF com a tentativa de interferir no lockdown no DF, BA e RS;

d) o não convencimento da cúpula das Forças Armadas até aqui em acompanhar Bolsonaro em apoio e até medidas mais extremas contra governadores e prefeitos.

5. A decisão do Ministro Edson Fachin de invalidar, em 8 de março, o processo de condenação de Lula pelo Juiz Sérgio Moro e a decisão posterior do STF de considerar Moro suspeito na condução da Lava-Jato representam uma reabilitação política do ex-presidente e recolocam Lula na disputa presidencial de 2022. Mantido o processo, Bolsonaro enfrentará um adversário dotado de densidade política e igualmente popular.

6. Bolsonaro está em seu momento de maior isolamento político e social, ainda que tenha uma base fiel e sólida, cada vez mais associada às ideias de extrema direita e reacionárias, nas forças policiais, em parte das forças armadas, nas igrejas fundamentalistas. Entre aqueles que se veem como empreendedores, em uma franja expressiva da pequenos e médios comerciantes e setores das classes médias e parte minoritária da classe dominante. Mas a movimentação de Bolsonaro nesta semana é produto de suas derrotas e o que ele tenta a partir da reforma ministerial é recompor o diálogo com Centrão e retomar a disputa pela maioria das forças armadas na ativa, que hoje ele não tem.

7. O desespero de Bolsonaro não é porque não consegue dar um golpe agora (ele sabe que não pode, que não tem força para isso agora), mas porque o projeto de reeleição em 2022 está seriamente ameaçado. Hoje provavelmente não seria capaz de vencer as eleições contra Lula. Bolsonaro e seu clã familiar e miliciano sabem bem que uma derrota em 2022 com perda da imunidade após uma catástrofe humanitária dessas proporções pode se traduzir em cadeia, perda patrimonial etc. A improvisada reforma ministerial e a crise com os militares foi uma movimentação de quem busca respirar, ganhar tempo, arrumar a casa e tentar estancar a sangria da sua popularidade, muito difícil diante do caos da pandemia e da vacinação, da inflação dos combustíveis, do desemprego e da pobreza.

8. Nada disso significa que Bolsonaro está inexoravelmente derrotado. Teremos, sim, enormes instabilidades no próximo período, frutos de contradições crescentes, que tendem a abrir espaços de ação política. Quanto mais avançar a crise no país e o projeto de Bolsonaro for ameaçado, mais provocações veremos e não é possível descartar tentativas de medidas autoritárias e golpistas. Este setor não vai aceitar sua derrota pacificamente, como já vimos pela reação do trumpismo nos EUA numa situação muito menos comprometedora de Trump em relação a pandemia e a crise econômica. Não devemos baixar a guarda, porque cada vez mais Bolsonaro vai apostar no caos e na polarização para sobreviver e manter-se viável para 2022.

9. O Brasil vive hoje uma crise multifacetada, onde o ultraliberalismo promovido pelo bolsonarismo ataca todos os direitos sociais, humanos e ambientais. Temos que lutar em todas as frentes.

Algumas ganham destaque:

  • A defesa da renda emergencial, condição para a manutenção do isolamento social e medida humanitária de solidariedade social face ao gravíssimo desemprego e ao recrudescimento da fome e da inflação;
  • O combate à pandemia, com a defesa das medidas de distanciamento social, verbas e apoio para a saúde pública e acesso a vacinas; e
  • A defesa da Amazônia, enfrentando uma devastação sem precedentes que afeta toda a humanidade, sendo um flanco de grande vulnerabilidade internacional do atual governo.

10. Mas a luta pelo Impeachment encabeça todas as demandas. Na conjuntura de acirramento da polarização política e social em que estamos inseridos, não há uma maioria possível para um golpe viável da extrema-direita; nem maioria social, nem institucional, nem mesmo nas Forças Armadas - para não falarmos de apoio das classes dominantes e das potências imperialistas. As bandeiras do Fora Bolsonaro e do Impeachment são, neste início de 2021, a saída democrática e civilizatória possível para a crise que desagrega o país.