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O futuro do Fórum Social Mundial

23 de dezembro de 2020

Gustave Massiah, Europe Solidaire Sans Frontière, 12 de dezembro de 2020

Nos últimos de vinte anos, o Fórum Social Mundial (FSM) delineou uma abordagem estratégica ao enfatizar a resistência necessária (propostas contra a financeirização e a globalização neoliberal) e destacar tanto a busca de alternativas e como a introdução de novas noções (comuns, buen vivir, propriedade social, democratização da democracia). No próximo período, poderemos atualizar estas questões: movimentos emergentes, ecologia, uma abordagem estratégica questionando, em particular, a relação entre formas de movimento e formas de partido, a relação entre movimentos e governos e o lugar da relação com os Estados.

Hoje, o Fórum continua sendo uma ferramenta importante mesmo que vários movimentos sociais (ecologistas, sindicatos, coalizões na luta contra o neoliberalismo, feministas, anti-racistas) tenham construído seus próprios mecanismos de intercâmbio em nível local e internacional.

Os “novos" e "velhos" movimentos
Os novos movimentos não rejeitaram os fóruns sociais mundiais, mas eles não se reconheceram neles e não se juntaram a eles. Uma hipótese (a ser testada) é que o distanciamento tem sido profundamente cultural. Os movimentos que se encontraram no FSM compartilham uma cultura que tem referência no movimento dos trabalhadores e nos movimentos de libertação nacional. Os novos movimentos e as novas gerações não rejeitam esta cultura, mas não a reconhecem plenamente em seus pressupostos e modos de ação. O debate se concentra em particular nas formas de representação e delegação. Alguns movimentos podem estabelecer uma ligação, como o movimento de mulheres, povos indígenas e movimentos anti-racistas. É por isso que a interseccionalidade (classe, gênero, origem) precisa ser explorada em maior profundidade e abre novas perspectivas. A consciência da contribuição feita pelo movimento ecologista e climático de emergência é essencial. O FSM deve ser um espaço para novos movimentos.

Diante da ofensiva da direita
Nos últimos anos, a mudança de período tem sido abrupta. O aumento das lutas foi seguido por um período de recuperação pelas classes dirigentes do capitalismo mundial. O neoliberalismo se torna austeridade e a repressão endurece. As ideologias de segurança, identitárias e racistas são reforçadas e se impõem em vários países com surtos fascistizantes. Vários governos progressistas, especialmente na América Latina, foram derrubados ou foram exauridos. Os movimentos marcam o golpe da mudança de época. As mobilizações continuam, mas a resistência se torna predominante. A falta de um projeto comum emergindo dos movimentos e sendo encaminhado por eles resultou em um recuo em direção ao nível nacional, às vezes em direção a grandes regiões. A oposição Norte-Sul se torna mais complexa, mas continua muito presente.

O impacto da pandemia
A crise pandêmica e climática reforça esta tendência de controle autoritário do Estado. Ele perturba situações e equilíbrios; põe em questão a solidariedade internacional, o internacionalismo e o altermundialismo. Para uma crise que é por definição global, as respostas são sobretudo nacionais e estatais. As instituições internacionais são pouco escutadas e marginalizadas. Os movimentos respondem com ações de solidariedade local e resistência a seus Estados. As contradições estão crescendo. Em muitos países, os confrontos se opõem às alianças em torno das políticas de segurança e às direitas populistas, com movimentos que exigem liberdades democráticas, a defesa dos direitos sociais e a emergência climática.

Como abordamos as mudanças?
O debate atual no FSM deve permitir que se tirem lições para o futuro dos Fóruns Sociais Mundiais. As crises da pandemia e do clima aprofundam as tendências do período aberto em 2015. Mas introduzem muitas descontinuidades que os movimentos devem levar em conta ao definir sua estratégia; elas pesam sobre as possíveis evoluções do FSM. Entre estas questões estão: qual será a evolução da globalização e do neoliberalismo? como responder à evolução das políticas de segurança do Estado? como as instituições internacionais reagirão à sua marginalização? como evoluirá a batalha contra a hegemonia cultural do neoliberalismo a partir de uma consciência da necessidade de igualdade no acesso aos direitos fundamentais? Em resumo, como podemos compreender a possível evolução das lutas de classe em suas diferentes dimensões sociais, políticas, ideológicas e culturais?

Novas iniciativas e novos desafios
Após um momento de questionamento, muitas iniciativas são lançadas para reconstruir as redes internacionais de movimentos. Eles demonstram a resiliência do movimento altermundialista e internacionalista. Embora buscando uma abertura internacional, as iniciativas têm bases mais fortes nas grandes regiões geopolíticas e geoculturais. A questão colocada é a do lugar dos Fóruns Sociais Mundiais nesta situação. Há acordo sobre a necessidade de uma renovação profunda do FSM e até mesmo sobre vivermos uma nova fase do movimento antiglobalização - lembrando que o movimento altermundialista não se resume apenas aos Fóruns Sociais Mundiais. Os movimentos ainda ativos no Conselho Internacional do FSM que levantaram a questão da situação do FSM e sua renovação devem ser saudados.

Superando os desafios
As últimas consultas facilitadas pelo Conselho Internacional do FSM demonstram o interesse e a vitalidade do Fórum como uma rede internacional alterglobalista. Eles mostram a vontade dos movimentos de construir respostas comuns à globalização capitalista neoliberal, agravada pela crise pandêmica e climática. Eles evidenciam que o Fórum Social Mundial continua sendo uma das referências importantes do movimento altermundialista. Concretamente no Conselho Internacional do FSM, 77 associações ligadas a mais de trinta grandes redes internacionais ou continentais estão trabalhando para abordar as principais questões que devem ser objeto de grandes debates nos próximos anos. Estes devem levar em conta as fraquezas e limitações do FSM devido a questões organizacionais internas e a um debate político insuficiente. Essas fraquezas, além disso, não são exclusivas do Fórum. Com as mudanças e conseqüências dos desenvolvimentos globais e suas rupturas, todas as redes internacionais estão sofrendo o impacto e estão sendo interpeladas. O debate se concentra em particular nas formas de organização que são essenciais para que o processo evolua.

Amanhã
O processo do Fórum Social Mundial continua com as reuniões e ações dos fóruns e redes sociais temáticos, nacionais, regionais e internacionais a ele associados. Estão previstas reuniões importantes com o Fórum Social Mundial virtual e presencial de 25 a 31 de janeiro de 2021 (no México), as mobilizações contra o Fórum de Davos em maio de 2021 e, posteriormente, com a realização de um novo FSM, provavelmente na Cidade do México em 2022.