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"Batalha da Paulista" deixa lições para movimentos

A rua é local fundamental para a resistência contra o bolsonarismo. É preciso retomá-la

31 de maio de 2020

Ana Carvalhaes, de São Paulo, fotos de Annelize Tozzeto

Foram quase quatro horas de tensão, duas delas de verdadeira batalha campal, entre dois lados nada equilibrados. A Polícia Militar de São Paulo, a mais bem treinada, bem equipada do país, de um lado. Torcedores antifascistas organizados em torcidas, em sua maior parte da corinthiana Gaviões da Fiel, mas também palmeirenses, sãopaulinos e santistas “antifas”, resolveram se manifestar pela democracia perto do local em que costumam se reunir os bolsonaristas da pauliceia e no mesmo dia de costume.

Os “manos” chegaram pouco depois do meio-dia, quase todos vestidos de preto, perfilados como um batalhão da antiguidade, com uma faixa enorme pela democracia, bateria e time de segurança próprio, e se instalaram no vão e na frente do Masp. Desde o início estiveram cercados por quantidade imensa de PMs em atitude ostensiva, que à imprensa diziam trabalhar para impedir o encontro com os verde-amarelos.

A quatro quadras dali, em frente ao edifício-sede da Fiesp, aboletaram-se os apoiadores do presidente neofascista – que em nenhum momento passaram muito de cem pessoas. Muito estridentes e com alguma inovação: havia quem portasse bandeiras neonazistas a Ucrânia (oi?), além de uma inocente taco de beisebol nas mãos de uma senhora em cuja camiseta se lia FASCISTA. O vídeo de um policial escoltando carinhosamente essa senhora (que havia ido provocar com o taco um pequeno grupo de transeuntes), rapidamente chegou às redes sociais.

Perto das 14h15, deu-se o ataque da PM à galera antifascista, no Masp. Segundo relato de advogada presente nesse instante, a guerra campal começou porque um bolsonarista, escoltado por ouros três, tentou passar por dentro do bloco oposcionista – numa evidente provocação.

O pessoal impediu a passagem, o que deu motivo para começar uma chuva de bombas de gás lacrimogêneo e o avanço da tropa de choque sobre os manifestantes.

Começou a resistência. Mais de 40 efetivos do Batalhão de choque, munidos de escudos, cacetete e lançadores de bombas, com 6 a 8 viaturas na retaguarda, levaram 90 minutos para forçar os antifascistas a se retirarem da avenida - ironicamente todo o tempo de uma partida de futebol. Foi uma batalha campal por uma retirada organizada e combativa, em que se demonstrou a organização, tenacidade e técnica do time de preto (evidentemente, experiência em enfrentar a violência policial, as organizadas têm de sobra).

Muita devolução das bombas de gás, pedras, cercas móveis de metal, pedaços de tapumes de obra arrancados para dificultar o andar do choque... valia tudo. Não houve dispersão de fato. As cinco prisões realizadas foram um saldo minúsculo frente ao tamanho e duração do enfrentamento.

O resultado da “batalha da Paulista”, transmitida ao vivo pelas emissoras jornalísticas, deixa algumas lições para a oposição social e política a Bolsonaro:

  1. As Polícias Militares são corporações a serviço do bolsonarismo. Cuidado.
  2. Os governadores têm que ser cobrados pela sociedade civil a colocar limites nos abusos policiais em todos os âmbitos.
  3. É preciso enfrentar o fascismo com atos. Não há o que dialogar com tacos de golfe, bandeira da Ucrânia, roupa de Klu-Kux-Kan e retórica nazi-fascista.
  4. A rua é o local privilegiado para esse enfrentamento; embora os abaixo-assinados e ações institucionais cumpram seu papel. É preciso começar a sair, com todas as medidas de distanciamento e proteção.
  5. É preciso unidade entre gregos e troianos, russos e baianos, para se opor à serpente. Se a Gaviões era maioria e ditou as táticas, havia tambem gente de torcidas rivais;

Quem dera que partidos políticos de oposição, em particular os a esquerda, e movimentos sociais pelo Brasil afora, atuassem como as organizadas de SP nesse domingo ensolarado. Ainda é tempo.